"Meu querido Jesus,
Desde a minha infância que me chamaste e me guardaste para ser Tua - e agora que ambos tomámos a mesma estrada - agora Jesus - eu vou no sentido errado.
Dizem que os que estão no inferno sofrem uma dor eterna devida à perda de Deus - que estariam dispostos a sofrer tudo aquilo se tivessem a mais pequena esperança de possuir a Deus. - Na minha alma sinto justamente essa dor terrível da perda - de Deus não me querer - de Deus não ser Deus - de Deus não existir realmente (Jesus perdoa-me estas blasfémias por favor - disseram-me que escrevesse tudo). Esta escuridão que me rodeia por todos os lados - não consigo elevar a alma para Deus - nem luz nem inspiração alguma me entram na alma. - Falo do amor pelas almas - de um terno amor a Deus – as palavras passam-me pelas palavras [sic, lábios] - e eu anseio com uma ânsia profunda acreditar nelas. - Porque trabalho? Se Deus não existe – a alma não pode existir. - Se a Alma não existe então Jesus — também Tu não és verdade. - O Céu, que vazio - nem um pensamento do Céu me entra no espírito - porque não há esperança. - Tenho receio de escrever estas coisas horríveis que me passam pela alma. – Devem magoar-Te.
No meu coração não há fé - nem amor - nem confiança - há tanta dor - a dor da ânsia, a dor de não ser querida. - Quero a Deus com toda a força da minha alma - mas há entre nós - esta separação terrível. - Deixei de rezar - pronuncio as palavras das orações da comunidade - e faço tudo o que posso para retirar de cada palavra toda a doçura que ela tem para dar. - Mas a minha oração de união deixou de lá estar. - Deixei de rezar. - A minha alma deixou de estar unida a Ti - e contudo quando ando sozinha pelas ruas - falo Contigo durante horas seguidas - da minha ânsia de Ti. - Que íntimas são tais palavras - e no entanto que vazias, porque me deixam longe de Ti. -
O trabalho não me traz alegria, nem atrativo, nem zelo. Lembro-me de dizer à Madre Provincial que saía de Loreto - pelas almas - por uma única alma - e ela não compreendeu as minhas palavras. - Faço o possível. - Gasto-me - mas estou mais do que convencida - de que a obra não é minha. Não duvido de que foste Tu que me chamaste, com tanto amor e tanta força. - Foste Tu - eu sei que foste. É por isso que a obra é Tua e continuas a ser Tu - mas deixei de ter Fé - não acredito. - Jesus não permitas que a minha alma seja enganada - não permitas que eu engane seja quem for.
No chamamento disseste-me que eu teria de sofrer muito. - Dez anos - meu Jesus, fizeste em mim segundo a Tua vontade - e Jesus ouve a Minha oração - se isto Te agrada - se a minha dor e o meu sofrimento - a minha escuridão e a minha separação Te proporcionam uma gota de Consolo - meu querido Jesus, faz de mim o que quiseres - enquanto quiseres, que nada te importem os meus sofrimentos e a minha Dor. Sou Tua. - Imprime na minha alma e na minha vida os sofrimentos do Teu Coração. Não Te importes com o que eu sinto. - Não Te importes sequer com a minha dor. Se a minha separação de Ti, - levar outros a Ti e no seu amor e na sua companhia Tu encontrares alegria e satisfação - pois bem, Jesus, estou disposta com todo o meu coração a sofrer tudo o que sofro - não apenas agora - mas para toda a eternidade – se tal fosse possível. Apenas quero a Tua felicidade. – Quanto ao resto . por favor não Te incomodes – mesmo que me vejas desmaiar de dor. – Tudo isto é a minha vontade – quero saciar a Tua Sede com cada gota de sangue que possas encontrar em mim. – Não me permitas fazer-Te mal seja de que maneira for – tira-me a capacidade de Te magoar. – De alma e coração trabalharei pelas Irmãs – porque são Tuas. Todas e cada uma delas – são Tuas.
Peço-Te apenas uma coisa – por favor não Te incomodes a regressar depressa. Estou disposta a esperar por Ti para toda a eternidade. –
A Tua pequenina"
Beata Teresa de Calcutá
In Vem, sê a minha luz, ed. Alêtheia
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