segunda-feira, setembro 25, 2006

quando os aviões levantam voo...

Depois de uma missa de envio que consagra uma das etapas deste caminho, surgem as despedidas... É estranho só escrever isto agora como que só algum tempo depois possa falar sobre isso... Na verdade foi dia 15, há pouco mais de uma semana, mas parece que foi há uma eternidade...
É duro. É duro olhar para uma pessoa que nos marca profundamente, saber que ela vai fazer o que tanto desejamos e tão profundamente compreendermos e simultaneamente não nos querermos separar dela nunca mais. Tentar compreender que a partir daqui os caminhos se separam, e pior que isso.. não saber quando se vão voltar a encontrar, se é que algum dia se vão voltar a encontrar.. Já alguma vez tiveram esta sensação?! A de ter de deixar alguém que amam e admiram (e não porque essa pessoa morreu) sem saber se o futuro nos reserva algum encontro?! Quando a Sónia se abraçou a mim eu não chorava simplesmente, já soluçava desalmadamente. Não consegui conter a dor profunda de deixar partir uma pessoa cuja vida deve ser um exemplo para todos, mas que sobretudo me marca pelos gestos e palavras que me deixa atarrachados ao coração... Tive o impulso egoísta de não me querer separar nem dela nem de ninguém dos LD para o resto da minha vida (e se fizessemos uma grande comunidade, numa grande missão?!?).. Mas ela tinha que partir... Assim como a Ana, umas horas depois, também tinha que partir.. A Ana... Com quem me identifiquei tanto... A Ana que deixa um namorado (exemplar, por sinal), um bando de escuteiros e uma família extremosa.. Que dor! Querer ir com ela e não poder!! Foram demasiadas emoções para um dia.. Eu sei que todos temos que partir mas foi-me difícil aceitar os diferentes tempos e finalmente perceber que cada um vai para um canto diferente a sul do Equador.. Consola-me saber que agora estamos mais distantes mas mais solidários que nunca, consola-me saber que realizamos a vontade de Deus para nós e para os que de nós precisam, mas desola-me a falta dos abraços, das gargalhadas, das ansiedades e lágrimas partilhadas.
E no dia seguinte (como se não bastasse..) despedir-me da Joana no aeroporto.. A missão dela é o seu mestrado em Londres. Mas dela também vou sentir saudades dos comentários sarcásticamente inteligentes, da originalidade e das ideias non-sense.. My ladybug!
E ficar cá olhar para as "cadeiras vazias" da minha missa de envio e perceber as pessoas que já faltam e ainda não me fui embora. Olhar para os meus amigos e desiludir-me muito mas também surpreender-me muito. Olhar para os que não considero amigos e surpreender-me ainda mais! Perceber que este caminho também serve para perceber a importância que tenho e na vida de quem. Perceber que quem gosta de mim está comigo até à porta de embarque e depois já lá, e que os outros vão ficando pelo caminho, vão deixandos os lugares que sempre tiveram, vão-se esfumando e ganhando estatuto de recordações. Nem tudo pode ser fácil, mas tudo ajuda a crescer e tudo deve ser agradecido e rezado... Deus sabe o que faz e sabe também abrir os nossos olhos que às vezes não querem crer. Quero continuar a acreditar que tudo o que doí, cura...

segunda-feira, setembro 11, 2006

esclarecimento

Não, não me sinto nada corajosa. Como é que alguém pode sentir-se corajoso quando se encontra totalmente protegido?! Eu não vou para África por minha auto-recreação... Escolho livremente fazê-lo mas não o faço sozinha. Eu vou para Moçambique porque Alguém me chama e Alguém me garante que estará sempre comigo em todas as dificuldades e alegrias. Não vou sem seguranças nenhumas. Vou ter uma casa e um carro, vou vacinada, vou com pessoas que acreditam no mesmo que eu. Não considero que uma pessoa seja corajosa, só porque vai realizar um sonho de há 10 anos, porque vai fazer o que gosta e o que acredita ser o melhor. Não sou corajosa... Sempre quis fazer isto e de certo modo até sou completamente egoísta pela forma como já me desprendi de todos e de tudo.. Já fui, só ainda não estou lá. Não sou corajosa porque para mim é muito mais fácil partir do que ficar... Era muito mais corajoso ficar numa sociedade materialista, hedónea e descrente. Eu vou para uma sociedade em que todas as pessoas acreditam, em que há tempo, vida e sons que fazem vibrar e em que o pouco que há é de agradecer. Vou sem que nada me prenda. Não tenho emprego, nem divídas, nem casa, nem namorado.. Se voltar tenho a casa e a protecção dos meus pais. Afinal qual é o risco que corro?! Nenhum, pra além do de me apaixonar irremediavelmente por aquela terra e aquelas gentes. Não me custa partir. É fácil, é o que sempre quis. É saber que tudo o que eu possa dar, vou recebê-lo em quantidades desproporcionalmente maiores. O que é que eu perco afinal?! Só se for dinheiro.. mas isso é perder, de facto, alguma coisa!?!
Pois é, meus amigos, para que percebem que isto não tem nada a ver com coragem mas com dar resposta Aquele que sempre me deu tudo na vida. E se Ele me deu tudo, o que é que é este nada que lhe posso dar em troca?! Só lhe posso dizer que sim. É inevitável e irresistível! Vocês conseguem dizer que não a quem vos ama profundamente e a quem amam?!
Quem me dera poder fazer mais. Definitivamente, é tudo menos coragem.
Baci

quinta-feira, setembro 07, 2006

Il Signore ti ristora

"Il Signore ti ristora. Dio non alontana.
l Signore vienne ad incontrarti, vienne ad incontrarti."
Foi com esta nova música que Taizé mais uma vez se revela sempre igual e sempre diferente. Taizé não muda, mas mudamos nós e as pessoas com quem nos cruzamos.. E desta vez não acolhi Taizé com o espanto habitual do impacto de regressar à aldeia mágica. Não me deslumbrei, nem surpreendi. Simplesmente cheguei uma vez mais a este kilometro de paz e harmonia e instalei-me como se esta fosse a minha casa desde sempre. Também já era a quarta vez e ter feito exercícios há 2 meses ainda me permite uma certa força interior que só precisava de ser ligeiramente acomodada. Mas foi com alegria que me senti consolada e confirmada na missão com Leigos em África. E foi com alegria que descobri mais umas preciosidades humanas. Para quem não sabe, o meu autocarro era organizado pela Igreja Lusitana o que me levou numa fase inicial a partir um pouco desconfiada, mas ao perceber a sua essência e também da Igreja Presbetiriana (também representada) pude perceber que é de facto é muito mais o que temos em comum do que o que nos separa.
Os campos de girassóis, o lago, a capela do silêncio, a ponte do TGV e a boleia do irmão, a Olinda com os seus teatrinhos, as orações, a Marie e a sua experiência no Congo, os anti-sociais albaneses e os franceses descalços, o cupccino do Oaik, o padre alemão, os indíos, a Vânia, a Fátima, o Miguel, o Ricardo, o Cláudio, a Elisabete e o Pedro, a Sara, o João... Os encontros felizes e as decisões difícieis. O irmão David e o irmão Alois... A despedida sem a certeza do próximo regresso... A paz! Acima de tudo a paz! Paz gerada pelo poder daquelas orações que arrepiam e convertem os mais incrédulos.. Deus sempre ali, na chuva, no sol...
O que nos vale é que Taizé está sempre lá e podemos sempre voltar a este pedaço, tão surpreendentemente real, de Reino de Deus já presente na terra.
Uma descoberta: é preciso cultivar a vulnerabilidade.
Baci